Porque se o José Wilker pode, eu também posso.

domingo, 26 de fevereiro de 2017

Oscar 2017

Mais um ano que passa, mais um Oscar que chega, mais uma vez ninguém se importa. Nada como o niilismo da existência diária revertido em meu post anual no blog.

OK, Oscar 2017. Basicamente:
Sabe aquela sua tia que faz um café super fraco, e com muito açúcar, mas que toda vez que você vai na casa dela você toma então se acostumou mesmo e nem repara mais? Sou eu, com o Oscar. Tá uma merda, como foi ano passado e como foi antes disso. De uma lista de nove, você não consegue três que são realmente exemplos máximo da arte do cinema americano. Mas ainda me dou ao trabalho de baixar e assistir todos na lista. Por quê? Ninguém sabe.

Esse ano, temos apenas nove indicações, já que a Pixar não fez a parte dela de lançar um filme incrível pra esse período. A Academia pode indicar dez filmes, e juro por Deus que toda vez me lembro daquela cena clássica de Jurassic Park: só porque você pode, não quer dizer que deve. Puta que me pariu, sei que é possível indicar dez filmes e que colocar “Indicado a Melhor Filme” na capa do DVD ajuda a vender, mas por favor. É super possível fazer um TBT e indicar cinco apenas. Ou seis. Não precisa só porque pode. O melhor que tenho a dizer sobre esses filmes é que quase todo têm ou menos de 2h ou só um pouquinho a mais, então se decidir assistir... não vai perder tanto tempo da sua vida assim?




A chegada

(Arrival. Denia Villeneuve, 2016)

            Antes de ver esse filme, tudo o que sabia sobre ele era que existiam aliens e uma linguista estava tentando traduzir o que os aliens falavam. Em nenhum momento imaginei que se tratava de um filme “sério” – vamos combinar que se você coloca a Megan Fox de óculos (pra mostrar como ela é esperta!) e várias explosões, isso bem que podia ser a premissa básica de um filme do Michael Bay. Mas não, é um filme dramático com aliens. Alguma parte do meu subconsciente que um dia viu Marte Ataca!  é incapaz de aceitar esse tipo de combinação e o estranhamento nunca mais foi embora.
            Tenho vários problemas com esse filme: o pacing é muito devagar (35 minutos pra eu ver a porra do alien que sei que existe porque aparece no trailer e é premissa básica da narrativa, pelo amor); ele se leva a sério demais, o que me deu um destoante absurdo porque são aliens que parecem as Ultrabeasts do último jogo de Pokémon; a teoria linguística que precisa ser aceita para que o “plot twist” faça sentido é ridícula pra mim; é impossível não pensar em “Interestelar com linguística” no final.
            Mas gosto de várias outras coisas: Amy Adams é uma ótima atriz; o processo de comunicação/tradução com os aliens é interessante para mim, como linguista que sou; a edição (de imagem e de som) está incrível.
            Agora, o que esse filme está fazendo aqui, numa lista de indicados ao Oscar pra Melhor Filme? Não faço a menor ideia, imagino que alguém é muito bom de cama e esteve muito ocupado fazendo lobby individual. Todos os prêmios técnicos são válidos, mas... sério. Aliens. Sou incapaz.

Indicações: Melhor Filme; Melhor Direção; Melhor Roteiro Adaptado; Melhor Edição de Som; Melhor Mixagem de Som; Melhor Cinematografia; Melhor Edição; Melhor Direção de Arte.
Deve levar: Melhor Edição de Som e Melhor Mixagem de Som são possibilidades, mas LA La Land está aí para acabar com essa alegria. Melhor Edição é discutível, mas se levasse não ficaria chocada. Mas, novamente, La La Land.



Um Limite Entre Nós

(Fences. Denzel Washington, 2016)
           
            O filme começa com o Denzel Washington, senhor da porra toda, fazendo praticamente um monólogo de 15 minutos. Foi nessa hora que pausei minha reprodução patrocinada pelo PirateBay e fui confirmar o que já suspeitava: é baseado em uma peça de teatro.
            Filmes baseados em peças de teatro são, em geral, uma coisa a parte. Pesados em diálogo, leves em tudo o mais. Esse filme não é uma exceção: é uma excelente peça filmada, mas não é um filme. A adaptação é quase inexistente, o que leva a um produto engessado, que não aproveita as várias possibilidades que o cinema permite explorar, inexistentes no palco de um teatro.
            Isso quer dizer que é ruim? Não quando o diálogo é incrível e você tem Denzel Washington (que deveria sim levar melhor ator, que se foda o irmão do Ben Affleck) e a Viola Davis diva suprema (que vai levar melhor atriz coadjuvante) mandando na tela. Mas, de um ponto de vista cinematográfico, é altamente pobre: não espere edições inteligentes, e ângulos de câmeras significativos ou paralelos visuais. É uma peça de teatro com trilha sonora. O que é muito bom e talz se você quer ver uma peça de teatro com trilha sonora, mas quando estou falando da linguagem do cinema, quero bem mais que isso. E o fato de este filme estar indicado pra Melhor Roteiro Adaptado é uma piada absurda. 

Indicações: Melhor Film; Melhor Ator Principal (Denzel Washington); Melhor Atriz Coadjuvante (Viola Davis); Melhor Roteiro Adaptado
Deve levar: Melhor Atriz Coadjuvante. Esse é o ano da Viola e ninguém pega esse prêmio das mãos dela. Denzel é a minha escolha pessoal pra Melhor Ator, mas ele sofre do mesmo mal que o Leonardo diCaprio e o Tom Hanks: eles são normalmente muito bons e as pessoas preferem premiar alguém que “surpreendeu” com o talento do que alguém que “está sempre bom porque é foda”.



Até o Último Homem

(Hacksaw Ridge. Mel Gibson, 2016)

            Todo Oscar tem um desses. Um desses filmes americanos da porra que sou obrigada a assistir porque está nessa lista, mas que nunca em um milhão de anos me daria ao trabalho. Esse ano, a honra vai pra um filme dirigido pelo Mel Gibson, também conhecido como o Babaca Antissemita e Racista Que Foi Famoso Um Dia.
            Esse filme foi um exercício pra minha paciência. E só não foi pior porque realmente gosto do Andy Garfield (indicado a Melhor Ator Principal, que não vai levar), mas mesmo assim. O filme começa com uma cena de guerra em câmera lenta com narração em voice-over e pula pra um flashback no qual o pai violento quebra a mão e sangra em cima de um túmulo (sutileza! simbolismo!)... e é tão clichê e tão descarado e tão desnecessário e tão forçado que nem sei o que dizer.
            O filme conta a história de um médico americano que se recusava a pegar em armas por motivos religiosos, e que salvou uma galera na Segunda Guerra. A história em si não é o problema, o problema é o sr. Mel Gibson, que no passado conquistou fama por fazer um filme de torture porn com Jesus Cristo e continua tentando muito chocar a audiência com explosões e sangues, como se isso fosse possível depois que milhões de Jogos Mortais. A terceira parte do filme envolve tranquilamente 15 minutos de pura violência e gritos e olhos explodindo e cérebro voando e ai meu Deus como a guerra é violenta, não é mesmo? Não recomendo, não vale a pena, o Mel Gibson ainda é um babaca, foram 2 horas da minha vida que nunca mais voltarão.

Indicações: Melhor Filme; Melhor Direção; Melhor Ator (Andrew Garfield); Melhor Edição de Som; Melhor Mixagem de Som
Deve levar: Se há um Deus misericordioso, nada. Porque se essa merda de filme levar Melhor Direção, desisto da vida.


A Qualquer Custo

(Hell and High Water. David Mackenzie, 2016)

            Todo Oscar também tem um desses também – aquele filme do qual você nunca ouviu falar. Aquele que provavelmente seria o favorito do Zé Wilker por ser o mais hipster da lista. A honra de ocupar o posto de Indicação Hipster Que Ninguém Lembrará Ano Que Vem vai para A Qualquer Custo, a história de dois irmãos que começam a roubar bancos e do policial que cuida do caso (e está prestes a se aposentar, olha só!)
            A melhor coisa dessa filme é sua trilha sonora, ótima seleção musical, Tarantino se orgulharia. A segunda melhor coisa é que só tem 1h40min. Não tenho uma terceira coisa pra elogiar. Não é um filme ruim, em sim, é só um filme incrivelmente esquecível. Ele é tão bege que a Meg Ryan está julgando.

Indicações: Melhor Filme; Melhor Ator Coadjuvante (Jeff Bridges); Melhor Roteiro Original; Melhor Edição
Deve levar: O Jeff Bridges ganhar é possível, e não seria um absurdo nem nada. Melhor Roteiro Original deve ficar com La La Land mesmo.
           

Estrelas Além do Tempo

(Hidden Figures. Theodore Melfi, 2016)

           Estrelas Além do Tempo é um filme que resume um dos meus maiores problemas com a indústria no momento: filmes construídos para momentos e não para coesão e história. Sabe quando está assistindo filme, e existe uma cena/fala que você pensa na hora “nossa, certeza que isso está no trailer”? Exatamente.
O filme é uma série de cenas que você pode adicionar um “uhhhhu snap” no fundo, interligada de forma a criar um filme, mas falta alguma coisa pra que a história flua de um modo orgânico. Narrando uma versão incrivelmente romantizada da história real de três mulheres negras que conquistaram seu espaço no mundo da NASA, esse é um filme entretente com um ótimo elenco, mas que é basicamente uma versão ligue-os-pontos de todos os filmes inspiradores de história real que você já viu na vida.

Indicações: Melhor Filme; Melhor Roteiro Adaptado; Melhor Atriz Coadjuvante (Octavia Spencer)
Deve levar: Um grande sorriso e uma camiseta “Fui No Oscar e Lembrei de Você”




La La Land: Cantando Estações


(La La Land. Damien Chazelle, 2016)
           
            Estava exausta desse filme antes mesmo de ver o trailer. Aí vi o trailer e minha exaustão só subiu. Curto a Emma Stone, não tenho nada contra o Ryan Gosling e amo musicais, então você imaginaria que ia curtir esse filme, certo? Errado. Por alguns motivos: não aguento mais casal hétero e cis se apaixonando; não aguento mais filme romântico em que conflito ocorre por falta de comunicação (conversem com seus namorados, amiguinhos, dica); não aguento mais ver a mesma história. Sei muito bem que o ponto de La La Land é capitalizar na nostalgia, mas, olha em volta. Não precisa ficar nostálgico, a gente está engolindo essa mesma história faz anos, a única diferença é que a galera manda whats pro crush e não carta pra futura esposa.
            Agora, eu seria capaz de perdoar muita coisa, mas muita coisa, mas não capaz de perdoar um simples fato: você fez um musical com atores que não sabem cantar. Ponto final, fim de conversa, valeu a participação, boa sorte na vida. Ninguém canta nada. Como é possível que o mundo caiu de pau em cima do Russell Crowe por Le Miserable e não vi ninguém falando nada da Emma Stone?? Me senti pessoalmente atacada pela incapacidade vocal demonstrada no dueto dos dois. E, sem brincadeira, esse filme não tem nada a ganhar por ser um musical: as músicas são monótonas, cantadas por quem não sabe cantar e servem apenas pra me tirar do filme e me fazer pensar “caralho, ninguém nem fez aula de canto?” Ele seria tão melhor se fosse apenas um filme com bastante música instrumental, sabe.
            E sei que reclamei por dois parágrafos, mas na verdade não odiei La La Land. O terço final do filme (quando eles param de tentar forçar o canto, olha só) é realmente bom, a edição desse filme é incrível, a visão e o design necessário para criar esse universo é louvável. Mas  a hype toda desse filme não é merecida, ele é entretente e bonitinho, acabou. Galera do elenco que não para de falar que o filme foi um “risco” precisa procurar a palavra no dicionário – que não tem um filme mais calcado no “seguro” com um toque gourmet de musical do que esse.

Indicações: Melhor Filme; Melhor Direção; Melhor Ator Principal (Ryan Gosling); Melhor Atriz Principal (Emma Stone); Melhor Roteiro Original; Melhor Trilha Sonora; Melhor Canção; Melhor Edição de Som; Melhor Mixagem de Som; Melhor Direção de Arte; Melhor Cinematografia; Melhor Figurino; Melhor Edição.
Deve levar: Possivelmente, todos ou uma boa parte dos técnicos, com destaque especial para Edição de Som, Mixagem de Som e Direção de Arte. Esse é um dos cotados para ganhar Melhor Filme e juro por tudo o que é mais sagrado que não existe UM universo em que La La Land é um filme melhor do que Moonlight. Claramente Oscar nunca foi um poço de coerência, então veremos o nível da putaria. Emma Stone é forte candidata também, e esse seria um prêmio merecido caso realmente acontecesse.
           


Lion: Uma Jornada para Casa

(Lion. Garth Davis, 2016)

            Esse foi o filme que me fez parar, respirar fundo e pensar “ok, agora sim Oscar”. Estou apaixonada por ele de todas as formas que você consegue pensar: atuação, edição, fotografia, trilha sonora, roteiro... ele é incrível, muito incrível... e não vai levar absolutamente nada nesse Oscar (yay!).
            Lion conta a história de um garotinho indiano que se perde da família e é adotado por uma família australiana. Ele trata temas complexos e duros sem usar narração voice-over em nenhum momento, confiando que você é capaz de entender o que está acontecendo pela belíssima composição de imagens e som. Se tem um filme dessa lista que recomendo de verdade que você assista, esse filme é Lion. Ele acerta em todos os quesitos de um jeito raramente encontrado, é um exemplo do que a arte visual do cinema pode fazer e de como é possível construir uma narrativa não somente baseada em diálogo e narração. Lindo e emocionante. Só assiste, vale a pena.

Indicações: Melhor Filme; Melhor Ator Coadjuvante (Dev Patel); Melhor Roteiro Adaptado; Melhor Trilha Sonora; Melhor Cinematografia
Deve levar: Nada, senta e chora o absurdo.
Merecia levar: Melhor Ator Coadjuvante – Dev Patel, além de gato, tem uma plasticidade emocional incrível. Melhor Roteiro Adaptado deve ir pra Moonlight (justo, inclusive), mas sou muito mais Lion para Cinematografia do que La La Land, que deve levar.


Manchester À Beira-Mar

(Manchester by The Sea. Kenneth Lonergan, 2016)

            Sofrência: o filme. Manchester À Beira-Mar conta a história de um homem que perde o irmão e precisa voltar pra sua cidade natal pra cuidar do sobrinho e enfrentar seu passado, dan dan dan! O filme conta com a realmente brilhante atuação do Casey Affleck (irmão do Ben, que já estava pronta para odiar por princípio genético) e da Michelle Williams, que em 4 segundos vem e mostra como ela realmente é boa nesse negócio de atuação, bem como apresenta uma história interessante, desenvolvida com extremo cuidado.
            Não sei muito o que dizer sobre esse filme, na verdade. Ele é um drama pesado com boa atuação e um ótimo final. Ele não chega nem perto de ser o melhor da lista, mas não é o pior também. Duvido que cause muita hype ou que seja lembrado em dois anos. Ele existe. E é válido, mas não é chamativo o suficiente para chamar muita atenção.

Indicações: Melhor Filme; Melhor Direção; Melhor Ator (Casey Affleck); Melhor Ator Coadjuvante (Lucas Hedges); Melhor Atriz Coadjuvante (Michelle Williams); Melhor Roteiro Original
Deve levar: Melhor Ator. Olha, queria muito que fosse o Denzel Washington. Mas deve ser do baby Affleck e vai ser uma escolha justíssima. Em qualquer outro ano, Michelle Williams teria chance real de levar, mas com a Viola Davis arrasando como está? Improvável.



Moonlight: Sob a Luz do Luar

(Moonlight.Barry Jenkins, 2016)
           
            Conversando com um amigo, comentei que só faltava Moonlight na minha lista de filmes de Oscar pra ver, e disse que estava preocupada com a possibilidade de ser muito pesado, já que sabia genericamene do que o filme se tratava (identidade negra, homossexualidade, uso de drogas e relacionamento interpessoal) e que estava com preguiça antes mesmo de começar.
            Adoro estar errada nessas coisas.
            Moonlight é um filme extremamente delicado, composto com maestria e adaptado pro cinema com precisão cirúrgica disfarçada de arte (olha só Um Limite Entre Nós, como é possível adaptar do teatro sem parecer que estamos numa peça, dica) com atuações incríveis e uma das melhores edições dessa lista. Sem a menor brincadeira, Moonlight é o claro vencedor de Melhor Filme desse ano – sim, pessoalmente gostei mais de Lion, mas admito que o melhor filme, cinematograficamente falando, é 100% Moonlight e será praticamente impossível não criar um discurso de racismo na Academia caso La La Land ganhe o prêmio máximo. Pense em Formation da Beyoncé perdendo pra Hello da Adele e vai entender o que estou falando.
            Lindo filme, ótimo filme, que o mundo me dê mais Moonlights e menos La La Lands em 2017.

Indicações: Melhor Filme; Melhor Direção; Melhor Ator Coadjuvante (Mahersahala Ali); Melhor Atriz Coadjuvante (Naomie Harries); Melhor Roteiro Adaptado; Melhor Trilha Sonora; Melhor Cinematografia; Melhor Edição
Deve levar: Melhor Filme, Melhor Direção e Melhor Roteiro Adaptado. Embora coloque minha mão no fogo somente pelo último.

Um comentário:

vamos ver o quanto você discorda de mim